Em medicina somente quem tem muito amor a dar, escolhe pediatria como especialidade. Os pediatras, diz a lenda, falam com Deus. Fazem seu diagnóstico através de uma semiótica ainda púbere, retirada da aura dos anjos ou do gesto incipiente do simbólico balbucio. Estes especialistas prescindem da fala para o diagnóstico, viajam além dos olhos, têm a leveza do beija-flor e a mão é pluma que cai, transformando o gesto em tolerância e carícia. Na criança, a dor, a mimica, a careta, o riso, o choro, a cor, o sabor, a lágrima têm uma interpretação fora dos tratados da semiologia tradicional. E, somente quem tem n’alma a permissão e o endosso de Deus, pode examinar a leveza do gesto, a complacência do olhar, a permissividade do sorriso, a mudez transitória, para conceber na criança, a certeza do diagnóstico e da terapêutica. Bastaria esta graça, este império de decências para colocar o pediatra bem mais perto de Deus. Amém